quinta-feira, 30 de julho de 2009

Errico Malatesta



Errico Malatesta


Nasceu em 1853 em uma família abastada do sul da Itália. De fato, os Malatesta dominaram a província de Rimini e, no período de maior expansão, os castelli do norte de San Marino, a província de Pesaro, parte de Ancona, Forlì e Ravenna, entre 1295 e 1528.
Desde muito jovem, Errico adere aos ideais
republicanos de Giuseppe Mazzini. Aos catorze anos de idade, protesta contra uma injustiça local, enviando uma carta ao rei Vítor Emanuel II, considerada por Luigi Fabbri como “insolente e ameaçadora”. As autoridades levaram o fato a sério e ordenaram a sua prisão, em 25 de março de 1868. Seu pai conseguiu libertá-lo recorrendo a amigos. Dois anos mais tarde foi novamente preso em Nápoles, por liderar uma manifestação, sendo suspenso por um ano da Universidade de Nápoles, onde estudava medicina.
Em
1871, após a Comuna de Paris abandona as idéias republicanas e adere ao anarquismo, ingressando na Associação Internacional dos Trabalhadores, AIT (Primeira Internacional) . Nessa época, entusiasmado com a atividade revolucionária, escreveria sobre a Internacional:
Todos entregavam para a propaganda tudo o que podiam, e também o que não podiam, pois quando o dinheiro escasseava, vendiam tranqüilamente os objetos de suas casas, aceitando com resignação as censuras das respectivas famílias. Pela propaganda esquecíamos o trabalho e os estudos! Enfim, a
Revolução estava a ponto de eclodir a qualquer momento e consertaria tudo. Alguns acabavam com freqüência na cadeia, todavia, saíam dali com mais energias do que antes: as perseguições não tinham outro efeito senão consolidar nosso entusiasmo. É verdade que as perseguições daquele momento eram fracas comparadas com as que viriam mais tarde. Naquela época, o regime havia saído de uma série de revoluções e as autoridades, rígidas desde o início com os trabalhadores, em particular no campo, mostravam certo respeito pela liberdade na luta política, uma espécie de indisposição parecida com a dos governantes austríacos e a dos Bourbons, que, todavia, se desfez tão rápido quanto se consolidou o regime, e a luta pela independência nacional foi relegada a um segundo plano.
Nessa época, Malatesta se dedica de corpo e alma à Federação Italiana e colabora com
Carlo Cafiero em L’Ordine e La Campana de Nápoles, abandonando seus estudos para dedicar os próximos sessenta anos de sua vida à agitação anarquista. Ao longo desse período passou várias vezes pela prisão e lutou não só na Itália como em outros países distantes e tão diferentes entre si quanto a Turquia e a Argentina. Participou também de insurreições na Bélgica, Espanha e Itália.
Em
1872, no Congresso de Saint-Imier, no cantão de Berna, conheceu Bakunin, de quem iria sofrer profunda influência:
... e assim fui para a Suíça com
Cafiero. Encontrava-me enfermo, cuspia sangue e tinha em mente a idéia de que estava tuberculoso... Enquanto atravessava à noite o Gotardo (naquela época ainda não havia o túnel, sendo necessário atravessar a montanha coberta de neve em diligência) resfriei-me e cheguei à casa de Zurique, onde vivia Bakunin, tiritando de febre. Depois das primeiras saudações, Bakunin me preparou uma cama e me convidou – ou melhor, me forçou – a deitar-me, cobriu-me com todos os cobertores que pôde encontrar e insistiu para que eu descansasse e dormisse. Tudo isso com um cuidado e uma ternura maternal que me chegaram diretos ao coração. Quando me encontrava envolto nos cobertores e todos pensavam que eu dormia, ouvi Bakunin dizer coisas admiráveis sobre mim e comentava melancolicamente:“É uma pena que tenha ficado tão enfermo, em breve o perderemos; não lhe restam sequer seis meses!”
Entre as influências que determinaram o desenvolvimento de Malatesta, a de Bakunin foi a mais importante. Malatesta se refere a ele como o grande revolucionário, aquele a quem todos nós vemos como nosso pai espiritual. Sua maior qualidade era a capacidade de comunicar fé, desejo de ação e sacrifício a todos aqueles que tinham a oportunidade de encontrá-lo. Costumava dizer que era preciso ter o diabo no corpo, e sem dúvida o tinha em seu corpo e sua mente.
No ano de
1873 eclodem os movimentos insurrecionais preparados por Bakunin e Cafiero. A polícia, advertida, faz fracassar esses movimentos. Malatesta se encontra em Puglia, foge numa carroça de feno, mas é reconhecido, preso e novamente encarcerado na prisão de Trani. No processo, em 1875, a propaganda pela Internacional não cessa e ele é absolvido. Junta-se então a Bakunin e Cafiero na Suíça. Nesse mesmo ano, apesar dos conselhos de Bakunin, parte para a Hungria a fim de participar da insurreição da Herzegovina contra os turcos. É preso e entregue à polícia italiana.
Juntamente com
Carlo Cafiero e outros militantes prepara uma insurreição em Letino, província de Caserta, em 1877, que se tornou legendário na luta social italiana. Ele e seus companheiros distribuiram armas para à população e queimaram arquivos públicos, proclamando o socialismo libertário. Malatesta e Cafiero, ainda que sabendo como fugir permaneceram no local e foram presos. A aventura durou doze dias, um policial foi morto, um outro foi ferido. No processo, todos declararam ter disparado contra os policiais, mas o júri os absolveu.
Malatesta volta a
Nápoles em 1878 e é constantemente vigiado pela polícia. Gasta sua herança em propaganda. Parte por um tempo para o Egito. Lá, o cônsul italiano o expulsa para Beirute; o de Beirute o envia para Esmirna. A bordo de um navio francês, torna-se amigo do capitão, que o conserva no navio até a Itália. Em Livorno, a polícia quer prendê-lo, mas o capitão se recusa a entregá-lo. Finalmente, Malatesta desce para Marselha e dali vai para Genebra onde ajuda Kropotkin a publicar Le Revolté. Expulso, dirige-se à Romênia, em seguida, à França, em 1879. De novo expulso, vai para a Bélgica, depois para Londres. Fixa-se, enfim, em Londres, onde trabalha como vendedor de sorvetes e bombons, antes de abrir uma nova oficina mecânica.
No
Congresso Anarquista de Londres de 1881 defendeu a criação de uma Internacional Anarquista.
Em
1885 exilou-se na Argentina, onde colaborou com os primeiros núcleos anarquistas, desenvolvendo uma ativa propaganda do Anarquismo, publicando o jornal Questione Sociale.
Regressou à Europa em
1889, desta vez indo para França. Mas logo teve de se exilar na Inglaterra.
Em 1913, vai à Itália, encontra-se com
Mussolini, diretor do Avanti, importante jornal operário. Ao longo do ano de 1914 dedica-se a acalmar as querelas pessoais entre os anarquistas. Entra em contato com as outras organizações revolucionárias, faz conferências e encoraja os sindicalistas ).
Em
Ancona, durante manifestações antimilitaristas das quais Malatesta participava, a polícia dispara e o povo se apodera da cidade. Os sindicatos decretam greve geral. É a “semana vermelha”. Porém, o exército intervém. Mussolini apóia o movimento em palavra, mas nada faz. Malatesta foge não sem declarar: Continuaremos a preparar a revolução libertadora que deverá assegurar a todos a justiça, a liberdade e o bem-estar.
Ainda em 1914, durante a
Primeira Guerra Mundial, proclama o Internacionalismo e manifesta-se contra aqueles que defendiam a causa aliada, inclusive seu amigo Kropotkin.
Em
1920, já na Itália, inicia negociações com os socialistas para fazer a revolução. A polícia tenta provocar desordens e assassiná-lo. Apesar dos obstáculos legais, seu jornal Umanità Nova tem uma tiragem inicial de 50.000 exemplares. Malatesta impulsiona a União Sindicalista Italiana (U.S.I.), de influência anarquista. No mesmo ano, em Ancona, eclode uma insurreição e as fábricas são ocupadas. Mas o movimento é traído pelos os social-democratas da C.G.T., que devolvem as fábricas.
Após um encontro anarquista em
Bolonha, no qual Malatesta toma a palavra, eclodem incidentes, há vítimas e feridos do lado dos operários e da polícia. Malatesta e a equipe do Umanità Nova são presos. Os protestos se multiplicam, ocorrem atentados fascistas. O fascismo, financiado pela burguesia e ajudado pelo governo, avança. Em contrapartida, Malatesta favorece a formação dos grupos armados.
Em julho de
1922, a greve geral é proclamada pela Aliança do Trabalho - união de diversos sindicatos estimulados por Malatesta. Mas os fascistas dizima pela força. Em seguida, em outubro, acontece a “marcha sobre Roma” e, na praça Cavour, os fascistas queimam um retrato de Malatesta. Umanitá Nova é proibido. Malatesta, aos sessenta e nove anos, retoma sua profissão de eletricista. A polícia o vigia em todos os seus movimentos.
Em
1924, surge a revista Pensiero e Volontà. O fascismo, no seu início, permite a liberdade de imprensa, mas a censura se faz cada vez mais severa até a proibição da revista em 1926. A oficina de Malatesta é destruída pelos fascistas e ele é obrigado a sobreviver com a ajuda dos camaradas, assim como de sua companheira, Elena Mulli e a filha desta última, Gemma.
Malatesta passou os últimos anos de sua vida na Itália e, durante o regime
fascista, correspondeu-se com Makhno e criticou duramente a Plataforma Organizacional dos Comunistas Libertários. Foi mantido em prisão domiciliar, morrendo em 22 de julho de 1932. Tal era o medo que inspirava às autoridades da época que, ao morrer, seu corpo foi jogado em uma vala anônima, para impedir que seu túmulo se transforma-se em um símbolo e ponto de partida para as agitações dos dissidentes.


Artigos de Malatesta
'MIKHAIL BAKUNIN

(20/05/1814 – 01/07/1876) Pensiero e Volontà, 01/07/1926
Hoje é o qüinquagésimo aniversário da morte de Bakunin: os anarquistas do mundo inteiro comemoram, como as circunstâncias o permitem, o grande revolucionário, aquele que todos nós consideramos como nosso pai espiritual. Eu gostaria de reproduzir aqui algumas de suas páginas mais eficazes e mais características. Seria a melhor e a mais útil homenagem. Mas estas páginas, ardentes de fé e de esperança, seriam certamente confiscadas, tendo em vista os tempos atuais, e eu as teria reimpresso em vão. Os leitores deverão contentar-se, portanto, com minha magra prosa, tão indigna para evocar tal homem. Há cinqüenta anos morria Bakunin, quase cinqüenta anos que eu o vi pela última vez em Lugano, já mortalmente atacado pela enfermidade e reduzido à sua própria sombra (ele me dizia, meio sério, meio irônico: “Meu caro, assisto à minha dissolução”). Entretanto, o simples fato de pensar nele ainda reconforta meu coração e enche-o de entusiasmo juvenil. Tal foi, antes de mais nada, o grande valor de Bakunin: dar fé, dar febre de ação e de sacrifício a todos aqueles que tinham a felicidade de se aproximarem dele. Ele próprio tinha o hábito de dizer que ‘preciso ter “o diabo no corpo”. E ele realmente tinha, no corpo e no espírito, o Satã rebelde da mitologia, que não conhece deus, que não conhece senhores, e que nunca pára na luta contra tudo o que entrava o pensamento e a ação.
Eu fui bakuniniano, como todos os camaradas de minha geração, infelizmente já distante no tempo. Hoje, depois de longos anos, não me considero mais como tal.
Minhas idéias se desenvolveram e evoluíram. Hoje, penso que Bakunin foi muito marxista na economia política e na interpretação histórica. Creio que sua filosofia se debatia, sem conseguir sair, numa contradição entre a concepção mecanicista do universo e a fé na eficácia da vontade sobre os destinos do homem e da humanidade. Mas tudo isso importa pouco. As teorias são conceitos incertos e mutáveis. A filosofia geralmente faz hipóteses embasadas nas nuvens, e, em substância, tem pouca ou nenhuma influência sobre a vida. Eis porque Bakunin permanece sempre, apesar de todas as discordâncias possíveis, nosso grande exemplo inspirador.
A crítica radical do princípio da autoridade e do Estado que ele encarna, continua bem viva. Sempre viva é a luta contra as mentiras políticas, a crítica das duas formas pelas quais oprimem-se e exploram-se as massas: a democracia e a ditadura. A reputação desse falso socialismo que ele denominava entorpecedor continua viva, e, de modo consciente ou não, ela tende a consolidar a dominação dos privilegiados embalando os trabalhadores com esperanças vãs. E, principalmente, o ódio intenso contra tudo o que degrada e humilha o homem, o amor ilimitado por sua liberdade, toda a liberdade, estão sempre vivos.
Que os camaradas pensem na vida de Bakunin, que foi cheia de lutas ideais e práticas, que foi um exemplo de devoção à causa da revolução. Que eles procurem – e todos nós também! – seguir seus passos gloriosos, mesmo de longe, cada um segundo suas forças e suas possibilidades!'


'CAPITALISTAS E LADRÕES Il Risveglio anarchico, março de 1911.


A propósito das tragédias de Houndsditch e Sidney Street Em uma ruela da City, ocorre uma tentativa de assalto a uma joalheria; os ladrões, surpreendidos pela polícia, fogem abrindo caminho à bala. Mais tarde, dois dos ladrões, descobertos numa casa de East-End defendem-se uma vez mais à bala, e morrem no tiroteio. No fundo, nada de extraordinário em tudo isso, na sociedade atual, exceto a energia excepcional com que os ladrões se defenderam.
Mas esses ladrões eram russos, talvez refugiados russos; e é também possível que tenham freqüentado um clube anarquista nos dias de reunião pública, quando ele está aberto a todos. Sem dúvida, a imprensa capitalista serve-se, uma vez mais, deste caso para atacar os anarquistas. Ao ler os jornais burgueses, dir-se-ia que a anarquia, este sonho de justiça e de amor entre os homens, nada mais é senão roubo e assassinato. Com tais mentiras e calúnias, conseguem, com certeza, afastar de nós, muitos daqueles que estariam conosco se ao menos soubessem o que queremos.
Não é inútil repetir, portanto, qual é nossa atitude de anarquistas em relação à teoria e à prática do roubo.
Um dos pontos fundamentais do anarquismo é a abolição do monopólio da terra, das matérias-primas e dos instrumentos de trabalho, e, conseqüentemente, a abolição da exploração do trabalho alheio exercida pelos detentores dos meios de produção. Toda apropriação do trabalho alheio, tudo o que serve a um homem para viver sem dar à sociedade sua contribuição à produção, é um roubo, do ponto de vista anarquista e socialista.
Os proprietários, os capitalistas, roubaram do povo, pela fraude ou pela violência, a terra e todos os meios de produção, e como conseqüência deste roubo inicial podem subtrair dos trabalhadores, a cada dia, o produto de seu trabalho. Mas esses ladrões afortunados tornaram-se fortes, fizeram leis para legitimar sua situação, e organizaram todo um sistema de repressão para se defender, tanto das reivindicações dos trabalhadores quanto daqueles que querem substituí-los, agindo como eles próprios agiram. E agora o roubo desses senhores chama-se propriedade, comércio, indústria, etc; o nome de ladrões é reservado, todavia, na linguagem usual, àqueles que gostariam de seguir o exemplo dos capitalistas, mas que, tendo chegado muito tarde e em circunstâncias desfavoráveis, só podem fazê-lo revoltando-se contra a lei.
Entretanto, a diferença de nomes empregados ordinariamente não basta para apagar a identidade moral e social das duas situações. O capitalista é um ladrão cujo sucesso se deve a seu mérito ou a de seus ascendentes; o ladrão é um aspirante a capitalista que só espera a oportunidade para sê-lo na realidade, para viver, sem trabalhar, do produto de seu roubo, isto é, do trabalho alheio.
Inimigos dos capitalistas, não podemos ter simpatia pelo ladrão que visa tornar-se capitalista. Partidários da expropriação feita pelo povo em proveito de todos, não podemos, enquanto anarquistas, ter nada em comum com uma operação que consiste unicamente em fazer passar a riqueza das mãos de um proprietário para as de outro.
Obviamente, refiro-me ao ladrão profissional, àquele que não quer trabalhar e procura os meios para poder viver como parasita do trabalho alheio. É bem diferente o caso de um homem ao qual a sociedade recusa meios de trabalhar e que rouba para não morrer de fome e não deixa morrer de fome seus filhos. Neste caso, o roubo (se é que se pode denominá-lo assim) é uma revolta contra a injustiça social, e pode tornar-se o mais imperioso dos deveres. Mas a imprensa capitalista evita falar desses casos, pois deveria, ao mesmo tempo, atacar a ordem social que tem por missão defender.
Com certeza, o ladrão profissional é, ele também, uma vítima do meio social. O exemplo que vem de cima, a educação recebida, as condições repugnantes nas quais se é, amiúde, obrigado a trabalhar, explicam facilmente como é que homens, que não são moralmente superiores a seus contemporâneos, colocados na alternativa de serem explorados ou exploradores, preferem ser exploradores e encarregam-se de consegui-lo pelos meios de que são capazes. Todavia, essas circunstâncias atenuantes podem também se aplicar aos capitalistas, e esta é a melhor prova da identidade das duas profissões.
As idéias anarquistas não podem, em conseqüência, levar os indivíduos a se tornarem capitalistas assim como não pode levá-los a serem ladrões. Ao contrário, dando aos descontentes uma idéia de vida superior e esperança de emancipação coletiva, elas os desviam, na medida do possível, tendo em vista o meio atual, de todas essas ações legais ou ilegais, que representam apenas adaptação ao sistema capitalista, e tendem a perpetuá-lo.
Apesar de tudo isso, o meio social é tão poderoso e os temperamentos pessoais tão diferentes, que bem pode existir entre os anarquistas alguns que se tornem ladrões, como há os que se tornam comerciantes ou industriais; mas, neste caso, uns e outros agem, assim, não por causa, mas a despeito das idéias anarquistas.

Mikhail Bakunin










Mikhail Aleksándrovich Bakunin




Mikhail Aleksándrovich Bakunin, também aportuguesado em Bakunine ou Bakúnine, (Premukhimo, 30 de maio de 1814Berna, 1 de julho de 1876) foi um teórico político russo, principal expoente do anarquismo.
Mikhail Aleksándrovich Bakunin (em
russo Михаил Александрович Бакунин) nasceu em 18 de maio de 1814 no calendário juliano na província de Tver, filho de uma rica família de proprietários de terras e desde 1837 começou a estudar a filosofia hegeliana. Em 1840, iniciou o curso de filosofia na Universidade de Berlim, onde logo começou sua atividade política, criticando a filosofia especulativa preferindo a teoria da ação política. De 1843 a 1848 viajou pela Europa, onde conheceu Karl Marx e Joseph Proudhon em Paris. Em 1848, na cidade de Praga participou do Congresso Eslavo com o objetivo de defender o pan-eslavismo e no mesmo ano participou da Revolução Proletária em Paris.
Em
1849, foi preso e condenado à morte por uma insurreição em Dresden, mas sua pena foi anulada e ele foi entregue ao governo russo, ficando preso em São Petersburgo e depois exilado na Sibéria em 1857. Acabou fugindo para o Japão e depois se fixou na Suíça, onde morreu em 19 de junho de 1876.
Por volta de
1863, tentou montar uma campanha em prol do anarquismo para irem à Polônia, mas não obteve sucesso.
Em
1868, fundou a Aliança Internacional da Democracia Social, que queria fazer a união com a Associação Internacional de Trabalhadores, da qual disputou a liderança com Karl Marx, mas, em 1872 acabaram se desentendendo no Congresso da Haia.
A expulsão de Bakunin da Associação Internacional de Trabalhadores se deu por divergências políticas com Marx.
Bakunin defendia que as energias revolucionárias deveriam ser concentradas na destruição das "coisas", no caso, o Estado, e não das "pessoas".
Em sua obra de
1872, Bakunin faz oposição a Comte, pois identifica a fonte de todo problema na centralização da autoridade e do Estado, que acabam por criar um obstáculo ao desenvolvimento das pessoas e das Nações. A paz e a realidade devem estar diante das coisas para a realização do homem, mediante a descentralização dos poderes e conhecimentos que levariam ao desenvolvimento dos homens.
A participação de Bakunin, a partir de 1870, acabou influenciando o proletariado e atraindo mais pessoas, e nesse mesmo período ele começou a criticar o comunismo de Estado, com propostas anti-autoritárias de socialismo. Com o fracasso da Comuna de Paris, as duas tendências começaram uma briga que a cada ano se agravava, de um lado os comunistas de Estado ou socialistas autoritários, como eram chamados pelos socialistas libertários, na época, até que, em 1876, a Associação Internacional dos Trabalhadores encerrou suas atividades.
Depois desse rompimento Bakunin planejava a construção de uma nova associação para unir os anarquistas de todos os países. Acabou criando grupos anarquistas em vários países do mundo, repassando a tradição anti-autoritária, mutualista e o caráter descentralizador do anarquismo para outros anarquistas, que viriam a se tornar célebres dentro do movimento, como
Élisée Reclus, anarquista francês, Piotr Kropotkin, anarquista russo, Enrico Malatesta, anarquista italiano, entre outros.
Após sua morte, diversos acontecimentos políticos com influência anarquistas puderam ser notados, como a
insurreição anarquista de 1918 no Rio de Janeiro, cujo movimento sindical era em sua totalidade composto pela maioria de anarquistas, e culminando com a Guerra Civil espanhola e a Revolução Espanhola em 1936, que seria a derradeira e última revolução de massas da ideologia anarquista.
Todavia, a obra e a vida de Bakunin influenciara diversos movimentos alternativos após os anos
1960, como os grupos ambientalistas, que utilizam a tática de ação direta, descrita em toda sua obra. Movimentos cooperativistas, de ocupação e reforma urbana, grupos e locais de trabalho auto-gestionados, também carregam em si o germe da ideologia anarquista e o pensamento célebre de Bakunin.



fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Mikhail_Bakunin





TEXTOS DE BAKUNIN
A Ilusão do Sufrágio Universal


Os homens acreditavam que o estabelecimento do sufrágio universal garantia a liberdade dos povos. Mas infelizmente esta era uma grande ilusão e a compreensão da ilusão, em muitos lugares, levou à queda e à desmoralização do partido radical. Os radicais não queriam enganar o povo, pelo menos assim asseguram as obras liberais, mas neste caso eles próprios foram enganados. Eles estavam firmemente convencidos quando prometeram ao povo a liberdade através do sufrágio universal. Inspirados por essa convicção, eles puderam sublevar as massas e derrubar os governos aristocráticos estabelecidos. Hoje depois de aprender com a experiência, e com a política do poder, os radicais perderam a fé em si mesmos e em seus princípios derrotados e corruptos. Mas tudo parecia tão natural e tão simples: uma vez que os poderes legislativo e executivo emanavam diretamente de uma eleição popular, não se tornariam a pura expressão da vontade popular e não produziriam a liberdade e o bem estar entre a população?
Toda decepção com o sistema representativo está na ilusão de que um governo e uma legislação surgidos de uma eleição popular deve e pode representar a verdadeira vontade do povo. Instintiva e inevitavelmente, o povo espera duas coisas: a maior prosperidade possível combinada com a maior liberdade de movimento e de ação. Isto significa a melhor organização dos interesses econômicos populares, e a completa ausência de qualquer organização política ou de poder, já que toda organização política se destina à negação da liberdade. Estes são os desejos básicos do povo. Os instintos dos governantes, sejam legisladores ou executores das leis, são diametricamente opostos por estarem numa posição excepcional.
Por mais democráticos que sejam seus sentimentos e suas intenções, atingida uma certa elevação de posto, vêem a sociedade da mesma forma que um professor vê seus alunos, e entre o professor e os alunos não há igualdade. De um lado, há o sentimento de superioridade, inevitavelmente provocado pela posição de superioridade que decorre da superioridade do professor, exercite ele o poder legislativo ou executivo. Quem fala de poder político, fala de dominação. Quando existe dominação, uma grande parcela da sociedade é dominada e os que são dominados geralmente detestam os que dominam, enquanto estes não têm outra escolha, a não ser subjugar e oprimir aqueles que dominam. Esta é a eterna história do saber, desde que o poder surgiu no mundo. Isto é, o que também explica como e porque os democratas mais radicais, os rebeldes mais violentos se tornam os conservadores mais cautelosos assim que obtêm o poder. Tais retratações são geralmente consideradas atos de traição, mas isto é um erro. A causa principal é apenas a mudança de posição e, portanto, de perspectiva.
Na suíça, assim como em outros lugares, a classe governante é completamente diferente e separada da massa dos governados. Aqui, apesar da constituição política ser igualitária, é a burguesia que governa, e é o povo, operários e camponeses, que obedecem suas leis. O povo não tem tempo livre ou educação necessária para se ocupar do governo. Já que a burguesia tem ambos, ela tem de ato, se não por direito, privilégio exclusivo. Portanto, na Suíça, como em outros países a igualdade política é apenas uma ficção pueril, uma mentira.
Separada como está do povo, por circunstâncias sociais e econômicas, como pode a burguesia expressar, nas leis e no governo, os sentimentos, as idéias, e a vontade do povo? É possível, e a experiência diária prova isto. Na legislação e no governo, a burguesia é dirigida principalmente por seus próprios interesses e preconceitos, sem levar em conta os interesses do povo. É verdade que todos os nossos legisladores, assim como todos os membros dos governos cantonais são eleitos, direta ou indiretamente, pelo povo.
É verdade que, em dia de eleição, mesmo a burguesia mais orgulhosa, se tiver ambição política, deve curvar-se diante de sua Majestade, a Soberania Popular. Mas, terminada a eleição, o povo volta ao trabalho, e a burguesia, a seus lucrativos negócios e às intrigas políticas. Não se encontram e não se reconhecem mais. Como se pode esperar que o povo, oprimido pelo trabalho e ignorante da maioria dos problemas, supervisione as ações de seus representantes? Na realidade, o controle exercido pelos eleitores aos seus representantes eleitos é pura ficção, já que no sistema representativo, o controle popular é apenas uma garantia da liberdade do povo, é evidente que tal liberdade não é mais do que ficção.
Michael Bakunin, in Ouvres, Vol. II, 1907.

A Imoralidade do Estado

A existência de um simples e único Estado necessariamente pressupõe a existência, e se necessário provoca a formação de diversos Estados, sendo natural que os indivíduos que se acham fora deste Estado e que são ameaçados por ele na sua existência e liberdade, deveriam virar-se contra ele. Aqui temos a humanidade partida em diversos Estados que são estranhos, hostis e ameaçadores entre si.
Não há direito comum, e nenhum contrato social entre eles, porque se um contrato e direito destes existissem, os vários Estados não mais seriam absolutamente independente um do outro, tornando-se membros federados de um grande Estado. A não ser que este grande Estado abrangesse toda a humanidade, seria necessário ter contra ele a hostilidade de outros grandes Estados, federados internamente. Desta forma, a guerra seria sempre a lei suprema e necessidade inerente da existência humana.
Todo Estado, seja ele de um caráter federativo ou não-federativo, deve procurar, sob a pena de absoluta destruição, tornar-se o mais poderoso dos Estados. Ele deve devorar os outros para que não seja devorado, conquistar para que não seja conquistado, escravizar para que não seja escravizado - porque duas forças similares e ao mesmo tempo alheias, não podem co-existir sem destruir uma à outra.
O Estado então é a mais escandalosa negativa, a mais cínica e completa negativa da humanidade. Ele estraçalha a solidariedade universal de todos os homens sobre a Terra, e une alguns deles somente para destruir, conquistar e escravizar todos os restantes. Ele tem sob sua proteção somente os seus próprios cidadãos, e reconhece direitos humanos, bondade e civilidade apenas dentro das dimensões de suas próprias fronteiras. E como ele não reconhece nenhum direito fora de seus domínios, ele atribui a si mesmo o direito de tratar com a mais feroz desumanidade todas as populações estrangeiras, que ele pode roubar, exterminar, ou subordinar de acordo com sua vontade. Se ele demonstra generosidade ou bondade para eles, ele não o faz por nenhum sentimento de dever fazê-lo: e isto porque não há dever senão para com ele, e para aqueles que o formam, através de um acordo mútuo e livre.
Como não há legislação internacional, e como isto não pode nunca existir de uma maneira séria e real sem demolir-se os reais bases e princípios da soberania dum Estado absoluto, o Estado não pode ter nenhum dever para com populações estrangeiras. Se então ele trata humanamente um povo conquistado, se não extermina e pilha completamente este, e não o reduz ao mais completo estado de escravidão, ele age desta maneira talvez por considerações de conveniência e prudência política, ou ainda talvez por pura generosidade, mas nunca por obrigação - porque ele tem um direito absoluto de dispor deles da maneira que quiser.
Esta flagrante negação de humanidade, que constitui a real essência do Estado, é do ponto de vista do segundo a suprema obrigação e a maior virtude: é chamado patriotismo e constitui a moralidade transcendente do Estado. Nós o chamamos de moralidade transcendente porque normalmente ele transende o nível de moralidade humana e justiça, seja privada ou pública, e por isso ele freqüentemente coloca-se em contradição. Então, por exemplo, para ofender, oprimir, roubar, saquear, matar, ou escravizar um companheiro, é para a moralidade comum dos homens, cometer um grande crime.
Mikhail Bakunin, in "The Political Philosophy of Bakunin", G.P. Maximoff 1953, The Free Press, NY.


A Idéia de Deus e a Liberdade Humana


Todas as religiões, com os seus deuses, os seus semideuses e os seus profetas, os seus messias e os seus santos, foram criadas pela fantasia crédula de homens que não atingiram ainda o pleno desenvolvimento e a plena posse das suas faculdades intelectuais. Em conseqüência disso, o céu religioso não passa de uma miragem na qual o homem, exaltado pela ignorância e pela fé, reencontra a sua própria imagem, mas dilatada e invertida, isto é, divinizada.
A história das religiões, a história do nascimento, da grandeza e da decadência dos deuses que se sucederam na crença humana, não é mais que do que o desenvolvimento da inteligência e consciência colectivas dos homens. À medida que na sua marcha historicamente progressiva descobriam, em si mesmos ou na natureza exterior, uma qualquer força, qualidade ou mesmo grande defeito, atribuíam-no aos seus deuses, depois de os ter exagerado e ampliado desmedidamente, como o fazem normalmente as crianças, num ato da sua fantasia religiosa.
Graças a essa modéstia e a essa piedosa generosidade dos homens crentes e crédulos, o Céu enriqueceu-se com os despojos da Terra e, por conseqüência, quanto mais rico se tornou o Céu, mais miserável se tornou a Terra. Uma vez instalada a divindade, foi naturalmente proclamada a causa, a razão, o árbitro e o dador absoluto de todas as coisas: o mundo passou a ser nada, a divindade tudo. E o homem, seu verdadeiro criador, depois de tê-la extraído do nada, sem disso se dar conta, pôs-se de joelhos perante ela, adorou-a e proclamou-se sua criatura e seu escravo.
O cristianismo é precisamente a religião por excelência, porque expõe e manifesta, na sua plenitude, a natureza, a própria essência de todo e qualquer sistema religioso, que é o empobrecimento, a submissão, o aniquilamento da humanidade em benefício da divindade.
Sendo Deus tudo, o mundo real e o homem são nada. Sendo Deus a verdade, a justiça, o bem, o belo, a força e a vida, o homem é a mentira, a iniqüidade, o mal, a fealdade, a impotência e a morte. Sendo Deus o senhor, o homem é o escravo. Incapaz de encontrar por si mesmo a justiça, a verdade e a vida eterna, a elas não pode chegar senão mediante uma revelação divina. Mas quem diz revelação diz reveladores, messias, profetas, sacerdotes e legisladores inspirados pelo próprio Deus; e, uma vez reconhecidos como representantes da divindade na Terra, como os santos pastores da humanidade, eleitos pelo próprio Deus para dirigir pela via da salvação, devem necessariamente exercer um poder absoluto.
Todos os homens lhes devem uma obediência passiva e ilimitada, porque contra a razão divina não há razão humana, e contra a justiça de Deus não há justiça terrena que lhes valha. Escravos de Deus, os homens devem sê-lo também da Igreja e do Estado, na medida em que este último é consagrado pela Igreja. Foi isso que o cristianismo compreendeu melhor que todas as religiões que existem ou existiram, sem exceptuar a maioria das antigas religiões orientais (que, aliás, só abarcaram determinados povos, enquanto que o cristianismo tem a pretensão de abarcar a humanidade inteira); foi isso que, entre todas as seitas cristãs, só o catolicismo romano proclamou e realizou com uma conseqüência rigorosa.
É por isso que o cristianismo é a religião absoluta, a última religião, e a Igreja apostólica e romana a única conseqüente, a única coerente. Agrade ou não aos metafísicos e aos idealistas religiosos, filósofos, políticos ou poetas, a idéia de Deus implica a abdicação da razão humana e da justiça humana; é a negação mais decisiva da liberdade humana e leva necessariamente à escravidão dos homens, tanto em teoria como na prática.
À menos que se queira a escravidão e o envilecimento dos homens, como o querem os jesuítas, como o querem os pietistas ou os metodistas protestantes, não podemos nem devemos fazer a menor concessão, quer ao Deus da teologia quer ao da metafísica. Porque, nesse alfabeto místico, quem começa por Deus deverá acabar fatalmente acabar em Deus, e quem adorar a Deus deve, sem ilusões pueris, renunciar corajosamente à sua liberdade e à sua humanidade. Se Deus existe, o homem é escravo. Porém, o homem pode e deve ser livre - por conseguinte, Deus não existe. Desafio quem quer que seja a sair deste círculo; agora escolham.
Mikhail Bakunin, retirado do livro Deus e o Estado.

O Estado: Alienação e Natureza


O Estado, como já disse, é, pelo seu próprio princípio: um imenso cemitério onde vêm sacrificar-se, morrer enterrar-se todas as manifestações da vida individual e local, todos os interesses parciais de cujo conjunto deriva a sociedade. É o altar onde a liberdade real e o bem-estar dos povos são imolados à grandeza política e quanto mais esta imolação é completa, tanto mais o Estado é perfeito.
Há a convicção de que o Estado cem por cento por excelência, sem retórica, sem frases, e, por isso, o mais perfeito Estado da Europa, é o Império Russo. Todos os Estados onde os povos podem ainda respirar são, do ponto de vista de ideal do Estado, incompletos, como são todas as Igrejas em comparação com a Igreja Católica.
O Estado é uma abstração devoradora da vida popular, disse já eu; mas para que uma abstração possa nascer, desenvolver-se e continuar a existir no mundo real, é preciso que haja um "corpo" coletivo real que esteja interessado na sua existência. Este, não pode ser constituído pelas massas populares, dado que são elas exatamente suas vítimas; tal corpo deverá ser constituído, isto sim, por pessoas privilegiadas, o corpo sacerdotal do Estado, a classe que possui e governa que é, no Estado, o que são os sacerdotes e os padres da religião na Igreja.
Com efeito, que vemos em toda a história?
O Estado foi sempre patrimônio de qualquer classe privilegiada: classe sacerdotal, nobiliárquica, classe burguesa, classe burocrática finalmente - quando todas as outras se esgotaram a si próprias como classes privilegiadas. O Estado, ergue-se ou cai, quase como uma máquina, mas o fundamental é que, para sua salvação e existência, haja sempre qualquer classe social privilegiada que se interesse pela existência e é precisamente o interesse desta classe privilegiada que se costuma chamar de "patriotismo".
É evidente, que todos os interesses pessoais e "pretendidos" do conjunto social que o Estado está "encarregado" de representar não são, na verdade, mais do que a negação, geral e permanente, dos reais interesses positivos das regiões, das comunas, das associações que, por serem grandes conjuntos humanos subordinados ao Estado, lhe conferem a categoria abstrata na aparência fictícia da justiça, dado que o Estado é de fato, um gigantesco cemitério onde, à sombra e tomando como pretexto justamente esta abstração, todas as melhores aspirações e todas as forças vivas dos países são imoladas e enxovalhadas.
E, como as abstrações não existem nem nelas próprias nem para outrem, mas apenas e só para elas, visto que não tem nem mãos para criar, nem pés para caminhar, nem estômago para digerir esta massa de vítimas que vêm junto dela para se fazerem devorar, é claro que, do mesmo modo que a abstração religiosa e celestial de Deus representa, na realidade, os interesses muito positivos e reais do clero que é também o complemento terrestre de Deus, do mesmo modo também a abstração política do Estado representa os interesses não menos positivos e reais da burguesia que é agora a principal, se não a única classe exploradora...
A propriedade do Estado é a miséria da nação real, do povo; a grandeza e o poderio do Estado resultam da escravidão do povo. O povo é, de resto, o inimigo natural e legítimo do estado; e como ele se submete, o que aliás acontece muitas vezes, às autoridades, todo o "poder" se lhe torna odioso. O Estado não é Pátria: é a abstração, a ficção metafísica, jurídica, mística e política da Pátria. As massas populares de todos os países amam, profundamente, a sua pátria, mas este amor é natural, real.
O patriotismo do povo não é uma idéia mas um fato; o patriotismo político, o amor ao Estado, não é a expressão concreta e adequada deste fato, mas a sua expressão desnaturada por intermédio de uma abstração da qual é de desconfiar e sempre em proveito de uma minoria exploradora. A Pátria, a nacionalidade como individualidade é um fato natural e nacional, fisiológico e histórico simultaneamente e, por isso, não é um princípio abstrato e idealizado; não se pode chamar um princípio humano senão àquilo que é universal e, portanto, comum a todos os homens, mas, neste caso, a nacionalidade separa-os: a pátria não é portanto um princípio. O que é princípio é sim, por outro lado, o respeito que cada um deve ter pelos naturais, reais ou sociais; ora a nacionalidade, é um destes fatos, por ser individualidade e nós devemos respeitá-la.
Violá-la é criminoso e, para falar a linguagem de Mazinni, ela torna-se um princípio sagrado de cada vez que é violada ou ameaçada e é por isto que me sinto, francamente e sempre, o patriota entre os patriotas oprimidos. A Pátria representa o direito incontestável e sagrado de todos os homens, de todo o grupo humano, associações, comunas, regiões, nações, etc., de sentir, pensar, de querer e de agir à sua maneira e esta maneira é, sempre, o resultado incontestável de um longo desenvolvimento histórico. Inclinamo-nos, assim, perante a tradição e perante a história, ou melhor dizendo, reconhecêmo-las, não porque as entendamos como sendo bandeiras abstratas, metafisicamente erguidas e suportadas jurídica e politicamente por sábios e intérpretes do passado, mas apenas e somente porque elas passaram de fato, para a carne e para o sangue, nos pensamentos e nas vontades reais, das atuais populações.
Que é portanto o estado?
É, respondem-nos os metafísicos e doutores em direito, a coisa pública; os interesses, o bem coletivo e o direito de toda a gente, opostos, jurídica e politicamente, ação dissolvente dos interesses e das paixões egoístas de cada um. É a justiça e a realização da moral e da virtude sobre a terra e, por conseqüência, não há ato mais sublime nem maior dever para os indivíduos do que devotarem-se, sacrificarem-se e mesmo morrer pelo triunfo e poderio de Estado.
Eis em poucas palavras a Teologia do estado.
Vejamos agora se esta Teologia política, do mesmo modo que a religiosa, não esconde, sob as suas belas e muito políticas aparências, muito comuns e muito "lamacentas" paixões e interesses. Vimos atrás o que chamamos de teologia política do Estado. Analisamos primeiramente a própria idéia de Estado tal como ela é apresentada por seus teóricos e defensores. É o sacrifício da liberdade natural e dos interesses de cada um, quer dos indivíduos quer ainda das unidades coletivas comparativamente pequenas (comunas, associações e províncias) aos interesses e à libertação de toda a gente, à propriedade do grande conjunto de toda a sociedade. Mas esta "toda a gente" e este "grande conjunto" o que são na realidade?
É a aglomeração de todos os indivíduos e de todas as coletividades mais restritas que a compõe. Mas desde o instante em que, para formar esse "grande conjunto" e para coordenar aí os interesses individuais e locais, para os sacrificar, então, desde este instante, de que se trata? Já não é o conjunto vivo que ao deixar "respirar" cada um à sua vontade, e se torna, por essa via, mais fecundo, mais livre e poderoso quanto mais se desenvolvem no seu seio a plena liberdade e prosperidade de cada um; já não é a sociedade humana natural, que confirma e aumenta a vida de cada um pela vida de todos, é, pelo contrário, a imolação de cada indivíduo como de todas as formas associativas locais, à abstração destrutiva da sociedade viva, a limitação ou, para melhor dizer, a completa negação da vida e dos direitos de todas as partes que constituem esse "toda a gente" para que se realize o apregoado bem de todo o mundo; isso é o Estado, é o altar da religião política sobre a qual é imolada, sempre, a sociedade natural...
O Estado é o irmão mais novo da Igreja. Não podemos encontrar outra razão, para a sua existência como abstração, do que partir da idéia metafísica ou teológica. Sendo pela sua própria natureza oposto a justiça humana, devemos buscar-lhe a sua "justificação" na ficção metafísica ou teológica da justiça divina. O mundo antigo ignorava, por completo, o conceito de nação ou de sociedade e o mundo moderno foi sujeitado e absorvido pelo Estado e, cada Estado, passou a fazer derivar a sua origem e o seu direito especial a existência e à dominação, de um qualquer Deus ou de um qualquer sistema de deuses que fosse o seu protetor exclusivo.
No mundo antigo, o homem, enquanto indivíduo, era desconhecido; a verdadeira idéia de humanidade era desconhecida. Não havia mais do que cidadãos e, é por isto, que nesta civilização escravagista a escravatura era um fenômeno natural e a base necessária ao gozo pleno da cidadania. Quando o cristianismo destruiu o politeísmo e proclamou o Deus único, os Estados tiveram que recorrer aos santos do paraíso cristão e cada Estado católico teve um ou vários santos como patrono que deveriam ser os seus defensores e intercessores junto ao senhor, que, nesta ocasião, devia ter-se encontrado, sem dúvida perante um situação embaraçosa.
Por outro lado, cada Estado tem ainda necessidade de declarar que o Senhor, o protege muito particularmente. A metafísica e a ciência política que só aparentemente repousam sobre a metafísica, mas na realidade obre os interesses das classes possuidoras, querem igualmente dar à existência do Estado uma base racional. Elas recomeçam a ficção de um acordo ou um contrato geral do povo pretensamente representado pelo Estado.
Segundo os democratas jacobinos, o Estado tem por tarefa tornar possível o triunfo dos interesses gerais e coletivos de todos os cidadãos sobre os interesses egoístas e divergentes dos indivíduos, das comunas e das regiões. O Estado é a justiça universal e a razão coletiva que se exercem sobre o egoísmo e a estupidez dos indivíduos. É a afirmação da ausência de valor e da razão em cada indivíduo em nome da sabedoria e da virtude de todos. É a negação efetiva ou o que é a mesma coisa, a infinita limitação de todas as liberdades particulares, individuais e coletivas, em nome da liberdade do "todo" da liberdade coletiva em geral - que, na realidade, não é mais do que uma abstração humilhante, deduzida da negação ou da limitação dos direitos dos diferentes indivíduos e baseada sobre a efetiva e real escravatura de cada um.
Sendo que cada abstração não pode existir senão na medida em que se apoia nos interesses positivos de um ser real, a abstração do Estado representa de fato os interesses positivos das classes possuidoras, dominantes e exploradoras e que se dizem "cultas" e cuja realidade se funda na imolação, em seu próprio proveito, dos interesses e da liberdade das massas reduzidas à escravidão.
Não há diferença fundamental entre o partido radical dos republicanos e o partido doutrinário moderado dos liberais constitucionais, todos têm a mesma origem e não diferem em seu "temperamento". Ambos colocam na base da organização social o Estado e a lei familiar, com a lei da "herança" e da propriedade privada que daí resulta, isto é, o direito da minoria possuidora explorar o trabalho da maioria privada da propriedade.
A diferença entre os dois partidos consiste em que, os liberais doutrinários querem concentrar todos os direitos políticos exclusivamente nas mãos da minoria exploradora, ao passo que os liberais radicais querem tornar extensivos estes direitos às massas exploradas do povo. Os liberais doutrinários consideram o Estado como uma fortaleza criada essencialmente para assegurar uma minoria privilegiada a posse, exclusiva dos direitos políticos e econômicos, enquanto os radicais, ao contrário, apoiam a existência do Estado perante o povo para afirmar que ele é o seu defensor contra o despotismo desta mesma minoria. É preciso admitir que a cópia e a experiência histórica estão do lado dos liberais doutrinários, por tanto tempo quanto dura a situação histórica em que o povo, pelo seu trabalho admita, mantenha e enriqueça os grupos privilegiados...
Da população, do povo, dizia, porque é incapaz de se governar por si próprio, de trabalhar não para si próprio, mas para outros, será invariavelmente governado pelas classes exploradoras. Nada podemos aí remediar, nem mesmo pela mais democrática das constituições, dado que, porque o fato econômico é mais forte que os direitos, que não podem ter o sentido e uma realidade senão na medida em que repousam sobre fatos econômicos. E no fim das contas a igualdade dos direitos políticos ou um Estado democrático constituem em si, a contradição mais flagrante no seus próprios termos.
Quem diz Estado ou direito político, diz força, autoridade, predominância: isto supõe a desigualdade de fato; quando todos governarem ninguém "é" governado e não existe, portanto Estado. Quando todos gozam, igualmente, dos mesmos direitos humanos, qualquer direito político perde a razão de sua existência. O direito político significa privilégio e desde que sejam todos privilegiados, o privilégio evapora-se e com ele o direito político. É por isso que as palavras Estado democrático e igualdade de direitos políticos, nada significam a não ser a destruição do Estado e de todos os direitos políticos.
Mikhail Bakunin.

Programa e Objetivo da Organização Secreta Revolucionária dos Irmãos Internacionais

A Associação dos Irmãos Internacionais quer a revolução universal, social, filosófica, econômica e política ao mesmo tempo, para que da ordem atual das coisas, fundada sobre a propriedade, a dominação e o princípio de autoridade quer religiosa, quer metafísica e burguesamente doutrinária, quer até mesmo jacobinamente revolucionária, não sobre em toda Europa num primeiro momento, e depois no resto do mundo, pedra sobre pedra. Ao grito de paz aos trabalhadores, liberdade a todos os oprimidos e morte aos dominadores, exploradores e tutores de qualquer espécie, queremos destruir todos os Estados e todas as igrejas, com todas as suas instituições e suas leis religiosas, políticas, jurídicas, financeira, policiais, universitárias, econômicas e sociais para que todos estes milhões de pobres seres humanos escravizados, atormentados, explorados, libertos de todos os diretores e benfeitores oficiais e oficiosos, associações e indivíduos, respirem enfim em completa liberdade.
Convencidos de que o mal individual e social reside muito menos nos indivíduos do que na organização das coisas e nas posições sociais, nós seremos humanos tanto por sentimento de justiça quanto por cálculo de utilidade, e destruiremos sem piedade as posições e as coisas a fim de poder, sem nenhum perigo para a revolução, poupar os homens. Negamos o livre-arbítrio e o pretenso direito da sociedade de punir. A própria justiça tomada no seu sentido mais humano e mais amplo, é apenas uma idéia, por assim dizer, negativa e de transição; ela coloca o problema social mas não o resolve, indicando apenas o único caminho possível para a emancipação, isto é, de humanização da sociedade pela liberdade na igualdade; a posição positiva só poderá ser dada pela organização cada vez mais racional da sociedade. Esta solução tão desejada, ideal de todos nós, é a liberdade, a moralidade, a inteligência e o bem-estar de cada um pela solidariedade de todos, a fraternidade humana.
Todo o indivíduo humano é o produto involuntário de um meio natural e social no seio do qual nasceu, desenvolveu-se e do qual continua a sofrer influência. As três causas de toda a imoralidade humana são: a desigualdade tanto política quanto econômica e social; a ignorância que é seu resultado natural e sua conseqüência necessária: a escravidão.
A organização da sociedade sendo sempre e em todos os lugares a única causa dos crimes cometidos pelos homens, há hipocrisia ou absurdo evidente da parte da sociedade em punir os criminosos, um vez que toda a punição supõe a culpa e os criminosos não são nunca culpados. A teoria da culpa e da punição surge da teologia, isto é, do casamento de absurdo com a hipocrisia religiosa. O único objetivo que se pode reconhecer à sociedade, em seu estado atual de transição, é o direito natural de assassinar os criminosos produzidos por ela mesma no interesse de sua própria defesa e não a de julgá-los e condená-los. Este não será propriamente um direito, na acepção estrita do termo, será antes um fato natural, aflitivo mas inevitável, signo e produto da impotência e da estupidez da sociedade atual: e quanto mais a sociedade souber evitar de utilizá-lo, mais ela estará próxima de sua real emancipação. Todos os revolucionários, os oprimidos, os sofredores, vítimas da atual organização da sociedade e cujos corações estão naturalmente cheios de vingança e de ódio, devem lembrar-se de que os reis, os opressores, os exploradores de toda espécie são tão culpados quanto os criminosos saídos da massa popular: eles são malfeitores mas não culpados, pois são, como os criminosos comuns, produtos involuntários da atual organização da sociedade. Não devemos nos espantar se no primeiro momento, o povo rebelado mate muito. Será talvez uma infelicidade inevitável, tão fútil quanto os estragos causados por uma tempestade.
Mas este fato natural não será nem moral, nem mesmo útil. A este respeito, a história está cheia de ensinamentos: a terrível guilhotina de 1793 que não pode ser acusada nem de preguiça, nem de lentidão, não chegou a destruir a classe nobre da França. A aristocracia foi se não completamente destruída ao menos profundamente abalada, não pela guilhotina, mas pelo confisco e venda de seus bens. E em geral, pode-se dizer que a carnificina política nunca matou os partidos; mostram-se sobretudo impotentes contra as classes privilegiadas, porque a força reside menos nos homens de que nas posições ocupadas pelos homens privilegiados na organização das coisas, isto é, a instituição do Estado e sua conseqüência assim como sua base natural, a propriedade individual.
Para fazer um revolução radical é preciso, pois, atacar as posições e as coisas, destruir a propriedade e o Estado, assim não se terá a necessidade de destruir os homens, e de condenar-se à reação infalível e inevitável que o massacre dos homens nunca deixou e não deixará nunca de produzir em cada sociedade.
Mas para ter o direito de ser humano para com os homens, sem perigo para a revolução, será preciso ser impiedoso para com as posições e as coisas: será preciso destruir tudo e, principalmente e antes de tudo, a propriedade e seu corolário inevitável: o Estado. Este é o segredo da revolução.
Não é preciso espantar-se se os jacobinos e os blanquistas que se tornaram socialistas antes por necessidade que por convicção, e para quem o socialismo é um meio, não o objetivo da Revolução. Pois eles querem a ditadura, quer dizer, a centralização do Estado e que o Estado os leve por necessidade lógica e inevitável à reconstituição da propriedade, é natural, dizemos nós, que não querendo fazer uma revolução radical contra as coisas, sonhem com uma revolução sanguinária contra os homens. Mas esta revolução sanguinária baseada na construção de um Estado revolucionário, fortemente centralizado, teria como resultado inevitável, como provaremos mais tarde, a ditadura militar com um novo senhor. Logo, o triunfo dos jacobinos e dos blanquistas seria a morte da Revolução.
Somos inimigos naturais destes revolucionários, futuros ditadores, regulamentadores e tutores da revolução, que, antes mesmo que os estados monárquicos, aristocráticos e burgueses atuais sejam destruídos, sonham com a criação de novos Estados revolucionários, tão centralizados e mais despóticos do que os Estados que existem hoje, que possuem uma vocação tão grande para ordem criada por uma autoridade qualquer e um horror tão grande pelo que lhes parece desordem e que nada mais é do que a franca e natural expressão da vida popular, que, antes mesmo que uma boa e saudável desordem se produza pela revolução, sonham já com o fim e o cerceamento pela ação de um autoridade qualquer que só terá o nome da revolução, mas que efetivamente nada mais será do que uma nova reação pois será uma outra condenação das massas populares, governadas por decretos, à obediência, à imobilidade, à morte, isto é, à escravidão e à exploração por uma nova aristocracia pouco revolucionária.
Compreendemos a revolução no sentido do desencadeamento do que se chama hoje de más paixões e da destruição do que da mesma língua se chama "ordem pública".
Não tememos, invocamos a anarquia, convencido de que esta anarquia, ou melhor, da manifestação completa da vida popular desencadeada, deve sair a liberdade, a igualdade, a justiça, a ordem nova, e a própria força da revolução contra a reação. Esta vida nova, a revolução popular, não tardará sem duvida a organizar-se, mas criará sua organização revolucionária de baixo para cima e da circunferência para o centro, conforme o princípio de liberdade, e não de cima para baixo nem do centro para a circunferência conforme a moda da autoridade, pois pouco importa se esta autoridade se chama Igreja, Monarquia, Estado Constitucional, República burguesa ou até mesmo Ditadura revolucionária. Detestamos e rejeitamos todos da mesma forma como fontes infalíveis de exploração e de despotismo.
A revolução tal como a entendemos deverá, desde o primeiro dia destruir radical e completamente o Estado. As conseqüências naturais desta destruição serão:
•A bancarrota do Estado;
•A cessação do pagamento das dívidas privadas pela intervenção do Estado, deixando a cada devedor o direito de pagar as suas, se quiser;
•A cessação dos pagamentos de qualquer imposto e do adiantamento de todas as contribuições, sejam diretas ou indiretas;
•A dissolução do exército, da magistratura, da burocracia, da polícia e do clero;
•A abolição da justiça oficial, a suspensão de tudo o que juridicamente se chamava direito, e o exercício desses direitos;
•Por conseqüência, a abolição do auto-de-fé de todos os títulos de propriedade, formais de herança, de venda, de doação, de todos os processos, de toda a papelada jurídica e civil, em uma palavra. Em todo o lugar e em todas as coisas o fato revolucionário, em vez do direito criado e garantido pelo Estado;&127;
•O confisco de todos os capitais produtivos e instrumentos de trabalho em proveito da associação de trabalhadores que deverão produzi-los coletivamente;
•O confisco de todas as propriedades da Igreja e do Estado assim como dos metais preciosos dos indivíduos em benefício da Aliança Federativa de todas as associações operárias, Aliança que constituirá a comuna. Em troca dos bens confiscados, a Comuna dará o estritamente necessário à todos os indivíduos que foram despojados, que poderão mais tarde, com seu próprio trabalho ganhar mais se puderem e se quiserem.
Para a organização da Comuna: a federação das barricadas permanentes e a função de um conselho revolucionário da Comuna pela delegação de uma ou duas pessoas de cada barricada, uma por rua ou por bairro, delegados investidos de mandatos imperativos, sempre responsáveis e sempre revogáveis. O Conselho comunal assim organizado poderá escolher, entre os seus, comitês executivos separados por cada ramo da administração revolucionária da Comuna.
Declaração da capital insurgida e organizada em Comuna que, depois de ter destruído o Estado autoritário e tutelar, o que ela tinha o direito de fazer porque era escrava como todas as outras localidades, renuncia a seu direito, ou melhor, a qualquer pretensão de governar, de impor-se às províncias.
Chamado a todas as províncias, comunas e associações, convidando a todos a seguirem o exemplo dado pela capital, de organizar-se primeiro revolucionariamente e, após, delegar, em um local convencionado de reunião, seus delegados, todos investidos de mandatos imperativos, responsáveis e revogáveis, para constituir a federação das associações, comunas e províncias insurgidas em nome dos mesmos princípios, e para organizar uma força revolucionária capaz de triunfar sobre a reação. Envio não de comissários revolucionários oficiais com faixas distintivas, mas de propagadores revolucionários em todas as províncias e comunas, sobretudo entre os camponeses que não poderão revoltar-se nem por princípios, nem pelos decretos de uma ditadura qualquer, mas somente pelo próprio fato revolucionário, quer dizer, pelas conseqüências que produzirá infalivelmente em todas as comunas a cessação completa da vida jurídica, oficial do Estado.
Abolição do Estado nacional ainda no sentido de todo o país estrangeiro, província, comuna, associação ou até indivíduos isolados, que se revoltaram em nome do mesmo princípio, sejam recebidos na federação revolucionária independente das fronteiras atuais dos Estados, embora pertencendo a sistemas políticos ou nacionais diferentes, e que as próprias províncias, comunas, associações, indivíduos que tomarem partido da reação estarão excluídos. É, pois pelo próprio fato da eclosão e da organização da revolução com vistas à defesa mútua dos países insurgidos que a universalidade da revolução, baseada na abolição das fronteiras e na ruína dos Estados, triunfará.
Não pode haver revolução política triunfante, a menos que a revolução política se transforme em revolução social, que a revolução nacional precisamente por seu caráter radicalmente socialista e destrutivo do Estado se transforme em revolução universal.
A revolução devendo fazer-se, em toda a parte, pelo povo, e a suprema direção devendo estar sempre no povo organizado em federação livre de associações agrícolas e industriais, organizando-se de baixo para cima por meio da delegação revolucionária abrangendo todos os países insurrectos em nome dos mesmos princípios independentemente das velhas fronteiras e das diferenças de nacionalidade, terá por objetivo a administração dos serviços públicos e não o governo dos povos. A aliança da revolução universal contra a aliança de todas as reações será a nova pátria.
Esta organização exclui qualquer idéia de ditadura e de poder dirigente tutelar. Mas, para o próprio estabelecimento desta aliança revolucionária, e para o triunfo da revolução contra a reação, é necessário que em meio à anarquia popular que constituirá a própria vida e toda a energia da revolução, a unidade de pensamento e de ação revolucionária encontre um órgão. Este órgão deve ser a Associação Secreta e Universal do Irmãos Internacionais.
Esta associação parte da convicção de que as revoluções nunca são feitas nem pelos indivíduos nem mesmo pelas sociedades secretas. Elas se fazem por si próprias, produzidas pela força das coisas, pelo movimento dos acontecimentos e dos fatos. Elas se preparam durante muito tempo na profundeza da consciência instintiva das massas populares, depois explodem, suscitadas aparentemente por causas fúteis. Tudo o que uma sociedade organizada pode fazer é, primeiramente, ajudar o nascimento de uma revolução difundindo entre as massas idéias correspondentes aos instintos das massas de organizar, não o exército da revolução - o exército deve ser sempre o povo - mas uma espécie estado-maior revolucionário composto de indivíduos dedicados, enérgicos, inteligentes e, sobretudo, amigos sinceros, e não ambiciosos nem vaidosos, do povo, capaz de servir de intermediário entre a idéia revolucionária e os instintos populares.
O números destes indivíduos não deve, portanto, ser enorme. Para a organização internacional em toda a Europa, cem revolucionários forte e seriamente aliados, bastam. Duas ou três centenas de revolucionários bastarão para a organização do maior país.



Emma Goldman

"A dúvida reina no espírito dos homens, pois nossa sociedade treme em suas bases. As instituições sociais não inspiram mais confiança e os mais inteligentes compreendem que a industrialização capitalista vai contra os próprios princípios que diz perseguir." EMMA GOLDMAN - O indíviduo, a sociedade e outros ensaios





Emma Goldman (27 de junho de 1869 - 14 de maio de 1940)




Célebre anarquista de origem lituana conhecida por seus escritos e seus manifestos libertários e feministas, foi uma das pioneiras na luta pela emancipação da mulher.
Nasceu no seio de uma família judia de Kaunas, na Lituânia, que regiam um pequeno hotel. Sofreu uma infância violenta, tendo sido estuprada com apenas 12 anos.Durante o período de repressão política que seguiu ao assassinato de Alexandre II, e quando tinha 13 anos, se transladou com sua família para São Petersburgo.
Emigrou aos Estados Unidos com uma irmã depois de um enfrentemento com seu pai, que pretendia casá-la aos 15 anos. Passou a trabalhar como operária têxtil. O enforcamento de quatro anarquistas depois do motim de Haymarket, em Chicago, animou a jovem Emma Goldman a unir-se ao movimento anarquista e converter-se aos 20 anos, em uma autêntica revolucionária. Nessa época casou com um emigrante russo, mas o casamento durou apenas 10 meses. Emma se separou e foi para Nova Iorque. Continuou legalmente casada para conservar sua cidadania americana.
Emma foi presa em 1893 na penitenciária das ilhas Blackwell. Publicamente instigou os operários à greve "Peçais trabalho, se não dai-vos, peçais pão, e se não dai-vos nem pão nem trabalho, tomem o pão". Esta citação é um resumo do princípio de expropriação preconizada pelos anarco-comunistas como Piotr Kropotkin. Voltairine de Cleyre saiu em defesa de Emma Goldman em uma conferência dada depois de sua prisão. Enquanto permaneceu na prisão, desenvolveu um profundo interesse pela educação das crianças, para o que iria dedicar-se anos mais tarde.
Junto com nove pessoas foi novamente presa em 1901 acusada de participar de um complô de assassinato contra o presidente William Mc Kinley. Um deles, Léon Czolgosz que havia dado o tiro, havia assistido uma conferência de Emma Goldman e se tornado anarquista desde então.
Entre 1906 e 1917 publica a revista anarquista mensal "Mãe Terra". Em 1910 escreve "Anarquismo e outros ensaios". Em 11 de fevereiro de 1916 é detida e presa de novo pela distribuição de um manifesto em favor do aborto. Durante vários anos, e cada vez que dava uma conferência, esperava ser detida, por isso sempre carregava um bom livro.
Em 1917 é encarcerada junto com Alexander Berkman por conspirar contra a lei que obrigava ao serviço militar nos Estados Unidos. Fez públicas suas críticas à Primeira Guerra Mundial e seu caráter imperialista.
Seu apoio a Berkman na tentativa de assassinato do industrial Henry Clay Frick a fez ainda mais impopular frente as autoridades americanas. Berkman foi preso durante vários anos.
Em 1919 foi expulsa dos EUA e deportada para a Rússia. Durante a audiência que tratava de sua expulsão o presidente da mesma qualificou a Emma como "uma das mulheres mais perigosas da América".
Residiu na URSS com A. Berkman entre 1920 e 1922 e participou da sublevação anarquista de Kronstadt. Dessa época datam seus escritos "Minha desilusão com Rússia" e "Minha posterior desilusão com Rússia". Desconforme com o autoritarismo soviético, se instalou definitivamente no Canadá. Em 1931 escreve sua autobiografia "Vivendo minha vida". Morreu em Toronto em 1940 e está enterrada em Chicago.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Voltairine de Cleyre



Voltairine de Cleyre foi uma das escritoras anarquistas mais prolíficas de seu tempo. Educada num convento católico, por insistência de seu pai se fez freira e lá viveu durante 4 anos.

O tempo que passou enclausurada naquele convento desenvolveu nela o convencimento de que as religiões se fundamentavam na repressão. Enquanto estava ali escreveu:"vi os intelectos mais brilhantes, intelectos que poderiam ter-se convertido em reluzentes estrelas das galáxias do talento, submetidas sob o peso das correntes, constantemente esquecidas e menosprezadas, a se perder..".
Aos 19 anos deixou o convento convertida numa atéia convicta.

Duas experiências marcaram durante a juventude sua personalidade: um discurso do advogado Clarence Darrow sobre o socialismo, que supôs seu primeiro encontro ante a problemática operária e a execução dos anarquistas de Chicago, acusados do bombardeio de Haymarket em 1886. Como para muitas pessoas de sua geração, a injustiça de Haymarket supôs a consolidação de seu anarquismo.

Teve maior talento literário do que qualquer outro anarquista norte-americano. Max Nettlau, historiador do movimento anarquista a descreveu como "a pérola da anarquia". A natureza inteira de Voltairine era a de uma asceta. Emma Goldman escreveu "sua aproximação à vida e aos ideais era a dos santos do velho testamento que castigavam seus corpos e torturavam sua alma pela glória de deus". Mas ela não tinha nada de religiosa.

Com o passar dos anos, evoluiu do anarquismo não-violento, que defendia a ação direta, próximo ao sindicalismo revolucionário da International Workers of the World, à defesa da violência quando “em determinados momentos históricos, os atos de violência eram o único meio de oposição à exploração e à tirania".

De Cleyre confiava na classe operária americana. Como recorda Georgakas “ela sempre se esforçou por dirigir-se à classe operária e criticou os anarquistas que, como Emma Goldman, dirigiam-se aos intelectuais e às classes burguesas".

Em 1910, em Nova York, durante um comício, ela fechou a cara diante de “respeitáveis salões” cheio de “gente respeitável”.

“Parece-me absolutamente horrível“ -escrevia ela- “julgo que o anarquismo se converteu num capricho para os intelectuais”. Na revista Mother Earth de Goldman declarava: “camaradas, caminhamos numa direção ... Nossa tarefa deve estar sempre entre os pobres, os abandonados, os homens e as mulheres que realizam o duro e brutal trabalho do mundo.''

Sua vida pessoal foi trágica. Ainda na juventude, seu grande amor se suicidou. De uma futura relação teve um filho, mas quando recusou viver com o pai da criança, se separou e não foi até 17 anos mais tarde, que poderia voltar a ver o filho. Outra desgraça lhe ocorreu em 1902, quando um estudante ciumento deu-lhe um tiro. “Apesar de que se recuperou” -escreveu Georgakas- “sua saúde se viu seriamente afetada. Conseqüentemente com seu caráter, recusou apresentar culpa contra seu agressor recomendando que este fora tratado num sanatório mental e não numa prisão”.

Entre 1889 e 1910 viveu na Filadélfia, entre as comunidades de imigrantes judeus pobres, que se converteriam posteriormente no principal distrito eleitoral anarquista dos EUA. Dava aulas de inglês e música e também aprendeu a falar e a escrever o Yiddish. Em 1912, quando estava no momento mais bem-sucedido como escritora e oradora, adoeceu, morrendo em Chicago em 12 de junho. Foi enterrada no cemitério de Waldheim em Chicago, junto aos túmulos dos anarquistas de Haymarket, cuja injustiça tinha inspirado sua vida.

Por desgraça, logo seu trabalho foi esquecido e seus textos deixaram de ser publicados e escritos "Ela foi como um breve cometa no firmamento anarquista”, segundo Avrich, “que logo foi esquecida por todos exceto por um círculo de amizades cujo amor e devoção persistiram muito depois de sua morte.”

Tiveram de passar mais de 50 anos para que seus escritos fossem resgatados, coincidindo precisamente com os movimentos feministas. "De qualquer jeito- escreveu Georgakas- o que dela mais se destaca é a maneira tão comprometida em que conduziu sua vida". Só um pouco antes de sua morte, Voltairine fez-se um elogio: "Morri como vivi, como um espírito livre, uma anarquista, sem dever nenhuma lealdade às leis, nem às terrenas, nem às divinas".


http://voltairine.org/

Mais uma vertente do ANARQUISMO: O Anarca feminismo



O Anarca-feminismo, como o anarquismo, se opõe a todo o tipo de hierarquia. Entretanto, as anarca-feministas dedicam maior atenção à desigualdade existente entre os sexos. As anarca-feministas acreditam que as mulheres constituem a classe mais explorada pelo capitalismo, porque seu trabalho doméstico e de reprodução é considerado sem valor econômico. A exploração e dominação da mulher é chamada por elas de patriarcado, o qual é o principal alvo de seu ativismo. Segundo elas, a desigualdade entre os sexos é o principal entrave para que homens e mulheres da classe trabalhadora possam se unir e lutar pelos seus interesses comuns.

O Anarca-feminismo se diferencia do feminismo por considerar que direitos conquistados dentro da sociedade capitalista serão sempre superficiais, visto que só poderão ser desfrutados pela classe dominante.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Anarco-feminismo